Mulher = mãe ?
Fiquei pensando com os meus botões. Será que a felicidade era mesmo tripla? No relato dos pais, eles mal tinham comida para os adultos da casa. Queriam um filho, mas se Deus tinha dado três (como eles falavam), Deus ajudaria a criar.
Mas a questão aqui não é Deus. O que me intrigou foi aquela foto na capa, da mãe com seu bebê, quase uma Virgem Maria do século XXI. Com sua "felicidade tripla". Claro, pois se ser mãe já é uma felicidade, ser mãe três vezes só poder triplicar essa alegria!
Lembrei das histórias que já ouvi de mães. Corpo deformado, bicos dos peitos sangrando, dores intensas, leite vazando de você como uma vaca, noites em claro, casamento naufragando, dinheiro apertando... Será que isso é sinônimo de felicidade?
Não quero aqui fazer discurso anti-maternidade. Mas não canso de pensar: por que ninguém fala nesse outro lado da moeda? O que todos dizem é que a maternidade é um período feliz, maravilhoso e de transcendental realização para a mulher. E por que só para a mulher? Por que a paternidade não é, do mesmo modo, única e indescritível (e necessária) para o homem?
O que eu vejo é que a "grande realização" da vida da mulher seria ser mãe. Quase um destino natural, valorizado por todos porque nós, mulheres, somos as únicas que podemos dar a vida a outro ser. Por isso, temos quase que uma obrigação em desejar a maternidade, e em nos realizarmos nela. Ser "mãe" se mistura ao ser "mulher", as duas qualidades sendo indissociáveis. Ser "mãe" torna-se um desejo compulsório de toda mulher.
Jogo aqui algumas perguntas para reflexão: quantas mulheres, entre todas que vocês conhecem, decidiram não ser mães? E quantas dessas são vistas com pena ou com estranhamento? Ao passo que, entre os homens, a decisão de ter ou não filhos é muitas vezes irrelevante. Por que essa diferença?
Nós estamos tão acostumadas ao "funcionamento do mundo" que essas diferenças são naturalizadas, tornando-se invisíveis, ou até mesmo explicadas pela ciência. Para muitos, a mulher tem o "instinto materno"; a testosterona tornaria o homem agressivo e, portanto, moldado para a competição do trabalho e pouco hábil com crianças; homens e mulheres são potencialmente iguais, como bradou o feminismo, mas você só é vista como uma mulher completa se tiver filhos...
Até onde essas imposições (invisíveis) nos controlam? Até que ponto o senso comum, ou mesmo a nossa ciência, nos diz o que fazer, como nos comportar, o que desejar? Será mesmo a maternidade a maior realização na vida uma mulher? Se a resposta for um "sim", por que a paternidade não é vista como a maior realização para um homem? Se eu não tiver filhos, eu serei menos mulher?
Tenho muitas outras perguntas, mas como me alonguei demais, termino com esta: o que faz com que (quase) toda mulher sonhe em ser mãe?
Marcadores: escrito por Orquídea, vida pública
4 Comentários:
Eu não sonho em ser mãe... e não me sinto menos mulher por isso. Acho que é a questão da sociedade mesmo, de todos querendo que você tenha filhos, desde seus pais até seus colegas de trabalho. Então esse sonho é meio que forçado para nossas cabeças...
Qual é a menina que nunca ganhou uma boneca na infância pra brincar de "mamãe"? E qual é a menina que nunca foi olhada de modo estranho pela família quando preferia jogar bola a brincar de casinha?
Então...
Simplesmente adorei o seu texto ;)
Pra ser sincera, nunca tinha parado pra pensar nas coisas sob esse ângulo, mas... é, seus questionamentos são muito bem fundamentados.
A respostas é simples, na minha opinião... É tudo uma questão de imposição cultural, de sociedade... Na Idade Média as mulheres nobres tinham seus filhos e mandavam pro cu de judas pra serem criados por outras mulheres. Não sentiam a menor falta deles e nem o menor remorço. Só depois de grande a molecada voltava a viver com os pais, e ninguém entrava em crise por causa disso.
Instinto maternal naturalmente feminino? Conta outra ;) Hehe
:*
Beijo
www.never_ever.weblogger.com.br
andei lendo outro dia que o homem, ao contrário de todas as outras espécies, não tem instinto. a gente não nasce "já sabendo" nada. ao contrário dos cachorros, por exemplo, que, qd parem, sabem oq fazer. portanto, essa idéia de "instinto materno", assim como todos os outros instintos, são apenas criações do processo civilizatório. eu, particularmente, não penso em ter filhos. posso até mudar de idéia futuramente, mas hoje eu acho q é algo qe não me atrai...
eu nao quero ser mae, ué! nao vou me sentir menos mulher por isso, mas sei q ha estranhamento da sociedade em funcao de alguns (ou varios) dos caminhos q percorro...
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